Tempo de viagem da água

Para diversas usinas hidrelétricas, não se pode considerar que todo o volume defluente das usinas de montante, durante um intervalo de tempo, esteja disponível para a usina de jusante no mesmo intervalo. Neste caso, o volume afluente à usina de jusante pode ser obtido através da propagação das defluências de montante. Na ausência desses dados, uma maneira simplificada de realizar esta propagação consiste em considerar o tempo de viagem, isto é, o intervalo de tempo médio que as defluências consomem até alcançar a usina à jusante. Esses tempos de viagem são considerados nas restrições de balanço hídrico das usinas hidrelétricas.

Dois tipos de modelagem de tempo de viagem podem ser considerados no modelo DESSEM, conforme descrito a seguir. Maiores detalhes podem ser consultados em 1 e no relatório técnico 2 sobre o uso dessa funcionalidade no modelo DESSEM.

Tempo de viagem da água por translação simples

Esta é a forma tradicional e mais simplificada de modelagem do tempo de viagem, na qual se considera que todo o volume de água defluído por uma usina de montante \(i\) em um determinado instante de tempo \(t\) chegará à usina de jusante \(j\) no instante de tempo \(t+\tau_{ij}\), onde \(\tau_{ij}\) é o tempo de viagem da água entre as duas usinas. A seguir mostra um diagrama esquemático desta forma de consideração do tempo de viagem, para \(\tau_{ij}=2\), onde a replicação das usinas tem o objetivo de mostrar sua operação ao longo do tempo.

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Curva de Propagação da Água

Um aperfeiçoamento em relação à modelagem descrita no item anterior é considerar que a vazão defluída pela usina de montante \(i\) no instante \(t\) chega ao ponto de jusante \(j\) de forma parcelada, entre os instantes \((t + {\tau_{ij}}_{min})\) até \((t + {\tau_{ij}}_{max})\). Os parâmetros \({\tau_{ij}}_{min}\) e \({\tau_{ij}}_{max}\) representam os tempos de viagem mínimo e máximo entre \(i\) e \(j\) , que se referem, respectivamente, a primeira e última parcelas da água defluída por \(i\) que chegam à usina \(j\).

Nessa forma de representação, devem ser fornecidos os percentuais da vazão defluída por \(i\) que chegam a cada instante de tempo entre \({\tau_{ij}}_{min}\) e \({\tau_{ij}}_{max}\). A curva que mostra esses percentuais de forma acumulada é denominada neste documento de curva de propagação da água, exemplificada na figura a seguir para um tempo de viagem máximo de 24h. Ressalta-se que os coeficientes da curva de propagação não variam com o valor da vazão defluente da usina de montante.

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A partir desta curva exata de propagação, é possível calcular as parcelas do montante de água defluído pela usina de montante \(i\) que chegam a cada instante de tempo entre \((t + {\tau_{ij}}_{min})\) e \((t + {\tau_{ij}}_{max})\). O esquema de saída dá água de \(i\) e chegada em \(j\) é ilustrado na figura a seguir, destacando-se a propagação das águas defluídas em \(t=1\) (azul) e \(t=2\) (vermelho). Neste exemplo, \(t + {\tau_{ij}}_{min}=1\), \(t + {\tau_{ij}}_{min}=5\) e os fatores de participação em cada instante de tempo são \(\{0,10; 0,20; 0,30; 0,25; 0,15\}\).

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Na modelagem matemática dessa funcionalidade, os termos referentes à defluência da usina de montante com tempo de viagem nas restrições de balanço hídrico podem ser adaptados para representar todas as parcelas da modelagem de tempo de viagem por propagação.

Acoplamento com o final do horizonte de estudo

Próximo ao final do horizonte de estudo, as vazões defluentes da usina de montante \(i\) não chegam à usina hidrelétrica de jusante \(j\) antes do final do estudo. Isto causaria um problema na avaliação do valor da água, já que o modelo considera o aumento do custo de operação ao se “perder” água na usina de montante, mas não contabilizar o benefício no armazenamento dessa água na usina de jusante, o que irá ocorrer no futuro bem próximo. Este volume de água perdido encontra-se na calha do rio entre as usinas \(i\) e j:math:j, conforme ilustrado na Figura a seguir, onde o tempo de viagem é de 3 horas e as defluências nas duas últimas horas ainda se encontram na calha do rio ao final do horizonte

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Em virtude dessa perda de água, o modelo tenderia a evitar defluências das usinas de montante com tempo de viagem para jusante nos períodos posteriores a \((T + {\tau_{ij}}_{max})\) onde \(T\) é o índice do último período. Ressalta-se que, mesmo havendo benefício em turbinar a água em montante, devido à geração de energia, a ausência da parcela referente ao aumento do volume armazenado a jusante na função de custo futuro pode fazer com que o “custo” dessa vazão defluente se torne muito alto.

A fim de contornar esse problema, o modelo DESSEM adiciona esse volume de água que está na calha do rio ao volume armazenado da usina j, apenas para fins de acoplamento com a função de custo futuro do DECOMP. Ou seja, em todas as restrições operativas do instante \(T\) será considerado o volume real da usina de jusante, porém na composição do custo futuro o coeficiente referente ao armazenamento nesta usina multiplicará também o volume que se encontra na calha do rio. Caso a usina \(j\) seja a fio d’água, utiliza-se o multiplicador da vazão afluente a essa usina, que também é impresso nos cortes do DECOMP. A Figura a seguir ilustra esse procedimento.

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Referências

1

Andre Luiz Diniz and Thiago Mota Souza. Short-term hydrothermal dispatch with river-level and routing constraints. IEEE Transactions on Power Systems, 29(5):2427–2435, 2014. doi:10.1109/TPWRS.2014.2300755.

2

A. L Diniz and T. N. Santos. Consideração do tempo de viagem da água nos modelos SIMHIDR e DESSEM-PAT. Technical Report, Relatório Técnico CEPEL 1006/11, 2011. URL: https://www.cepel.br/produtos/documentacao-tecnica/.