Caracterização Geral das Séries Hidrológicas

Discutem-se, a seguir, as principais características das séries hidrológicas.

Sazonalidade

Por estar diretamente relacionado a um fenômeno natural (chuvas) cujo comportamento varia de acordo com as estações do ano, as vazões afluentes às usinas hidrelétricas apresentam forte sazonalidade, como se observa na figura a seguir, que mostra um trecho da série histórica de Energias Naturais Afluentes (ENAs) para o submercado Sudeste, entre 1931 e 1971.

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A sazonalidade das vazões é tratada de forma adequada no modelo Modelo Autorregressivo Periódico - Par(p), utilizado pelo modelo GEVAZP para modelar as vazões afluentes às usinas hidrelétricas.

Dependência Temporal

Pode-se perceber também, na figura que mostra a Incerteza Hidrologica, que as séries com afluências mais elevadas em determinado mês também tendem a apresentar afluências mais elevadas que as outras séries nos meses subsequentes. Isto ocorre devido à forte dependência temporal (ou correlação temporal) entre as vazões naturais afluentes aos reservatórios, que consiste na influência que a vazão afluente de um determinado instante de tempo provoca na vazão natural afluente em instantes futuros. Essa dependência, que é uma característica fundamental da operação dos reservatórios é explicada por razões físicas:

  • quando ocorrem vazões afluentes elevadas de forma sistemática no tempo, o solo torna-se mais “enxarcado”, vazendo com que as chuvas nos próximos meses escoem mais rapidamente de maneira superficial no solo, tranformando-se mais rapidamente em vazões;

  • por outro lado, quando o solo está seco, o que é decorrente de vazões recentes muito baixas, a mesma quantidade de chuva mencionada no item anterior irá percolar de forma mais significativa no solo, resultando em vazões naturais afluentes mais baixas.

Desta forma, estabelece-se uma dependência temporal entre as vazões naturais afluentes em intervalos distintos de tempo. Em virtude da Discretização Temporal empregada nos modelos, deve-se representar, portanto, a dependência entre as vazões naturais afluentes em Períodos de tempo consecutivos.

Ressalta-se que essa dependência temporal entre as afluências é que motiva o conceito de Tendência Hidrológica, bastante empregado nos estudos hidrotérmicos.

Ao longo do tempo, diversas abordagens tem sido propostas não só no Brasil, mas em outros sistemas, para a consideração da tendência hidrológica em problemas de planejamento da operação hidrotérmica 1, adotando-se diversas abordagens, tais como:

  • a inclusão de vazões passadas como uma variável de estado adicional na função de custo futuro, que tem sido proposta na literatura há bastante tempo 2;

  • a inclusão da vazão prevista também como variável de estado na política de operação 3;

  • consideração de modelos autorregressivos periódicos 4;

  • utilização, de forma combinada com modelos anteriores, de modelos que utilizam uma variável exógena 5;

  • representação da condição hidrológica por cadeias de Markov 6

A figura a seguir ilustra esses trabalhos:

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Assim, visto que a hipótese de independência temporal das afluências, comumente adotada na literatura de programação estocásticas, não pode ser aplicada ao problema real de planejamento hidrotérmico no Brasil, ao modelar a incerteza das vazões os modelos de otimização energética levam em consideração essa dependência temporal através de um Modelo Autorregressivo Periódico - Par(p), cuja construção é feita considerando-se a correlação mensal entre as afluências. De forna a representar melhor também a correlação anual, este modelo foi posteriormente estendido para considerar um termo anual, levando ao Modelo Autorregressivo Periódico Anual - Par(p)-A.

Complementaridade e Correlação espacial entre as incertezas

Outro aspecto relevante a ser considerado na modelagem das incertezas é a complementaridade entre as incertezas referentes aos recursos às usinas hidrelétricas (vazão afluente) e as usinas eólicas (velocidade dos ventos), tanto entre si como em relação umas as outras. A figura a seguir, cujos dados são extraídos do site do ONS, mostra a Energia Natural Afluente (ENA Bruta) aos submercados no periodo entre 2018 e 2021. Os trechos destacados nos retângulos mostram situações em que, enquanto para determinado submercado houve acrésimo na energia afluente, em outro submercado houve um decréscimo.

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Já essa outra figura, extraída do relatório técnico do CEPEL 7, mostra um mapa de calor da matriz de correlações entre as médias mensais de 79 localidades com parques eólicos na região Nordeste.

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Referências

1

J.A. Tejada-Guibert, S.A. Johnson, and J.R. Stedinger. The value of hydrologic information in stochastic dynamic programming models of a multireservoir system. Water Resources Research), 31(10):2571–2579, 1995.

2

John D. C. Little. The use of storage water in a hydroelectric system. Journal of the Operations Research Society of America, 3(2):187–197, 1955.

3

J. R. Stedinger, B. F. Sule, and D. P. Loucks. Stochastic dynamic programming models for reservoir operation optimization. Water Resources Research), 20(11):1499–1505, 1984.

4

M. E. Maceira and C. V. Bezerra. Stochastic streamflow model for hydroelectric systems. In 5th Int. Conf. on Probabilistic Methods Applied to Power Systems -PMAPS. 1997.

5

J. Pina, A. Tilmant, and P. Cote. Optimizing multireservoir system operating policies using exogenous hydrologic variables. Water Resources Research), 53:9845–9859, 2017.

6

A. B. Philpott and V. L. de Matos. Dynamic sampling algorithms for multi-stage stochastic programs with risk aversion. European Journal of Operational Research, 218(2):470–483, 2012.

7

M. E. P. Maceira, A. C. G. Melo, J. F. M. Pessanha, C. B. Cruz, V. A. Almeida, and T. C. Justino. Uma abordagem para a representação das incertezas da fonte de geração eólica no planejamento da operação de longo e médio prazos - modelo NEWAVE - relatório final. Technical Report, CEPEL - Centro de Pesquisas de Energia Elétrica, 2021. URL: http://www.cepel.br/produtos/otimizacao-energetica/documentacao-tecnica/.